Wednesday, July 26, 2006

Do sétimo andar

Ele estava dormindo mal - como sempre - no seu tapete verde e áspero da sala escura d’um apartamento do 7º andar. Alguns raios de sol conseguiam invadir o lugar de maneira deformada, mas eram minoria e não causavam efeito. Acorda com seu sonho recorrente: A imagem do vôo de um besouro indo de encontro ao seu ouvido, sendo que, na hora da penetração é capturado com as duas unhas afiadíssimas dos dedos: indicador e polegar, funcionando como uma pinça e o partindo ao meio. Assustado ele passa a mão na cabeça, pensando no que ele fez antes de dormir. Drogou-se!, havia recordado. Tenta se levantar para fazer algo. Não havia nada para fazer. A sala continuava escura e entediante, tanto pra ele quanto pra ela. Ele então reflete, depois pensa em procurar outra droga qualquer. Reflete de novo, olhando pra mesa, procura algo, mas está com vergonha dela. Finalmente vai...

- Não vou não.

- Como assim não-vai-à-mesa? Você é meu personagem, sabia?

- Sim, eu sei.

- Então. A história precisa continuar e para tal você deve ir em direção à mesa.

- Acalme-se.

- Eu tô calmo. O que aconteceu? Isso é surreal: O meu personagem recusa-se a me obedecer!

- Ok. Serei claro e conciso como você mesmo me definiu: O fato é que eu cansei de participar de suas histórias, ninguém as ler, se você consegue viver assim, saiba que eu não!

- ... preciso de um café.

- E eu de um cigarro.

- Você não fuma.

- Faça-me fumar, ora.

- Ok.

Olhando o seu cigarro sobre a mesa fixamente como um gato ao avistar sua presa movendo-se...

- Dá logo essa porra de cigarro!

- Ok.

Ele pega o cigarro e começa a fumar.

- Grato.

- E agora?

- Bom, eu quero continuar participando de histórias, apenas, não das suas. Você não consegue emocionar nem uma telespectadora assídua de novela mexicana, tá certo que o segredo deles é a música de fundo, aindassim...Não, eu quero navegar em outras páginas, ser popular, quero ser adaptado às telas de cinema, ser metáfora em livros de auto-ajuda, ser fábula em edições de executivos bem-sucedidos.

- Vejo que criei um personagem egocêntrico.

- Hum. Personagem egocêntrico é uma redundância, todo personagem é egocêntrico, afinal, todos queremos ser o meio para emocionar as pessoas. É como um ator numa sala de cinema vendo o público emocionado com sua interpretação, a diferença é que a emoção deles tem menor escala que a nossa, já que eles interpretam a nós, os personagens. Você sabe disso. E tem mais, todo personagem é reflexo de seu autor, mesmo que mínimo.

- Discordo, em todo caso, e quanto a mim? o que farei sem meu personagem?

- Não seja deliberadamente dramático. Crie outro, mas dessa vez o crie mais parecido com você. Tente emocionar-se realmente com ele, coisa que não aconteceu comigo, assim você conseguirá o mesmo resultado com o leitor, e isso não é difícil, vocês não são tão diferentes assim uns dos outros, o problema é que se superestimam muito. Faça certo dessa vez, essa segurança que você me deu; com respostas rápidas e eficazes, tal qual personagens em filmes de ação da década de 90, não combina com você; assim fica difícil.

- É, talvez você tenha razão...

- Claro que sim, temos nossas semelhanças, afinal, eu sou um reflexo, mesmo que mínimo de você, mas é melhor assim, cada um segue o seu caminho, seja ele em páginas ou de outro modo.

- Ainda discordo dessa idéia de reflexo...e preciso de um cigarro, aceita outro?

- Sim...e café também.

- Café. Eu também adoraria.

Wednesday, July 19, 2006

Preciso Escrever...

O quê? Não sei, talvez sobre velhice...é, velhice, já que eu sempre...não. Ou melhor, sim. Ou melhor...talvez. É, sobre velhice hoje não, até mesmo porque iria parecer pretensioso e eu odeio parecer pretensioso, pelo menos explicitamente. Hoje eu tô afim de acabar comigo, de me sacanear, adoro fazer isso, é algo relaxante, não sei a razão...mas relaxa.

O "Texto" abaixo é o meu primeiro "about me" do orkut. Logo no início da rede de relacionamentos. Ele é...inocente! e tá comentado...agora!

falar sobre mim...
eu naum sou diferente de todo mundo...vejam só, eu faço parte de uma geração:
("naum" "...", Era uma escrita vergonhosa)

-- q naum tem certeza de nada por isso acha muito...bem...eu acho.
(A frase correta com a piadinha (putz) seria assim: "Que não tem certeza de nada, por isso ACHA muito. Bem...eu ACHO.")

-- q escreve - naum e vc - assim
(Pelo menos eu tinha consciência)

-- q sempre procura ser diferente uns dos outros, mas na verdade somos a mesma merda
(tipo...q?)

-- Somos filhos de liberais e netos de conservadores, por isso podemos fazer sexo no puteiro ou em casa, graças a deus (seja lá qual for)
(É, essa eu gostei.)

-- Assistimos muita tv, por isso naum falamos muito com nosso vizinho
(Chocante. Chocante. Baudrillard teria orgulho dessa frase!)

-- Por ter existido um fenômeno chamado globalização nós naum viajamos muito por acharmos q podemos ter o mundo na tv ou no pc, mas é um engano, por isso somos superficiais e medrosos, mas isso ainda dá tempo de consertar...
(Eu acho que originalmente esse "consertar" foi com "C", mas tudo bem)

-- Ah...a nossa geração tb é otimista, acha q dá tempo de consertar tudo, acha q o brasil é o país do futuro e naum do presente.
(Era um politizado também e devia achar que tava falando alguma novidade. Essa juventude!)

-- Na nossa geração naum tem stalinismo, comunismo, maoismo, castrismo... mas tem muito cinismo
(Ih, eu já vi essa frase em algum lugar. Que feio!)

-- nossa geração naum tem uma religião definida, alguns nem tem religião, ainda naum ligamos pra isso, talvez por existirem muitas opções...eu inclusive pretendo fazer um catalogo de todas as religiões e sair oferecendo pras pessoas da minha geração, nesse catalogo teria a descrição de cada uma; oq pode e naum pode fazer, quais os preços dos dízimos; opções de pagamento (cartão, parcelado), enfim...dá pra ganhar muito dinheiro com esse novo segmento de mercado.
(hum...é? ah bom)

-- a nossa geração chora
(Item para mostrar sensibilidade afim de atrair mulheres?)

-- nós jogamos mario e vimos chaves
(Qual geração não viu, afinal?)

Bem...eu sou tudo isso, eu sou dessa geração, a única diferença (lá vem ele querendo ser diferente, típico dessa geração) é q vivi até os 15 anos com a geração dos meus avós depois saltei direto pra atual.

(É. Ainda bem que evoluimos)

Wednesday, July 12, 2006

Só pra atualizar: COPA

Bom, eu vi todos os jogos dessa copa assim como vi todos das madrugadas de 2002. Acompanhei notícias referentes à copa 2 meses antes do início. Lia DIARIAMENTE (e eu não sei pq fazia isso) jornais esportivos (ou não) : mexicano, espanhol, argentino (o melhor), italiano, francês (tentava) e português. Acompanhei boa parte dos jogadores convocados e não-convocados antes e durante o torneio. Participei de fóruns com franceses, alemães, italianos, portugueses e argentinos acerca das seleções de seus países. Diante de tudo isso, posso tirar uma conclusão:

Eu gosto de futebol.

Mas bom...não é disso que eu quero falar, é chato ver a opinião de cada um, como se fossemos donos do assunto, sobre o torneio...e eu odeio ser chato, prefiro evitar. Foi interessante conversar com torcedores de outros países, levando em consideração que o que menos falávamos era sobre futebol. Os fóruns eram europeus e é interessante notar como eles são ainda tribais, como se ainda vivessem em aldeias. É bom falar com torcedores - pessoas comuns - visto que é o que pensa a maioria da população. A Espanha é dividida em tribos praticamente e esse é um problema sério em época de copa, visto que, a seleção não tem um espírito de uma equipe completa em todos os sentidos, o povo Catalão não sente tanto uma desclassifação (o que é sempre certo) da seleção espanhola, assim como outras regiões por lá...
Os Franchutes (franceses) são odiados por portugueses, apesar da grande migração dos portugueses para lá...os que estão em Portugal acusam os migrantes de se submeterem a lavar o chão das casas dos franceses. Os italianos são os mais unidos, já os argentinos são os mais chatos mas legais, dá pra se divertir...caso faça uma crítica, eles vêm com um texto de no mínimo 30 linhas expondo as glórias do seu país. Falar que eles são chatos é redundância mas são interessantes...tem uma relação de amor e ódio com Espanha, gostam de sua descendência italiana mas não é disso que eu quero falar também.

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Palavras-chave: Copa - Futebol - Patriotismo - Brasil
opiniões ou perguntas:

"O velho pão e circo?"

"Carência de ídolos"

"Engraçado eh, qdo a gente demonstra naums e importat mt com os jogos da seleção, os torcedores nos acusarem de "não-patriotas".
Na hora das eleições, qdo, de fato, precisamos demonstrar "amor à pátria", essa massa não dá as caras..."

"É lindo ver como todos são patriotas de quatro em quatro anos...
Ninguém vê bandeiras do nosso país na porta em outras épocas.
Assisto o jogo, vibro, xingo, torço, mas me lembrando que ''Brasil'' não é somente um time de futebol, e sim uma pátria.
A maioria pensa que é apenas ''um nome de uma federação esportiva''."

Oh My...
Tudo bem, eu até entendo as opiniões, eu só não perdôo os clichês...aí não dá.
Primeiro que futebol não é pão e circo, mesmo com àquela opinião do seu Borges - o tiozinho lá argentino. Não devemos nos superestimar tanto, os Ingleses, Alemães, Franceses e pequenos povoados indianos também gostam de futebol tanto ou mais que nós e param também pra verem suas seleções jogando e outras. Quanto à questão futebol e política: na Itália o político Seu Silvio Berlusconi - que por vezes é engraçado - é totalmente ligado ao Milan, provando uma mistura estranha entre futebol e política, no Brasil nunca um Presidente foi ligado ao futebol tão diretamente quanto ele. Ainda temos o caso da Coréia, que é um país com nível de educação altíssimo (é clichê falar isso, mas tudo bem) que nos jogos de seu país tudo pára por lá e após uma vitória a população vai aos montes para a rua comemorar. Isso é assustador levando em consideração que futebol por lá é novo.

Também não subestimemos os brasileiros. Ele não confunde futebol com política nem esquece a situação do Brasil pela copa. Ele apenas torce pra sua seleção como fazem outros países. Não é como na África d'onde o capitão de um time que se classifica pras oitavas de finais é nomeado ministro da educação ao chegar em seu país.

Quanto à bandeira brasileira, que só se coloca em época de copa. O que é verdade. Agora...idaí? Será que querem que a população coloque bandeira do brasil nas casas em dias de guerra? de eleição? ou qualquer outra data, aliás, pra quê colocar bandeira em casa? isso é coisa de americano nacionalista...pra quê ser nacionalista? quando o ideal seria a mistura de povos, a convergência cultural. Num mundo ideal não existiriam mais fronteiras, mas as pessoas têm tendência ao separatismo, elas precisam mostrar A bandeira. Um ato simbólico, nada mais.

Ah...e quanto à população:
1 - A população não vai esquecer da nossa situação - até pq ela já esquece com ou sem copa, é só acabar o Jornal Nacional e começar a novela que ela esquece (portanto culpar a COPA é um tanto quanto injusto).

2 - A população que tem consciência dos problemas também não vai esquecer da situação do Brasil, consegue separar e entender que n'outro dia tudo volta ao "normal" mas no dia anterior ela divertiu-se com amigos e família.

COPA é mundial. Inglaterra, França, Coréia...todos são "alienados" nesse mês...bueno, ao menos é uma alienação boa ou melhor que os gladiadores em Roma.

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Brasil é o país do futebol...dizem. Algumas notícias linkadas:

Idoso chinês agride pessoas após derrota do Brasil


Com casa em chamas, torcedor chinês só se preocupa com o jogo da Copa

China tem seis mortes devido ao Mundial

Thursday, July 06, 2006

Lugares Comuns II

Falas transcritas do filme "Lugares Comuns"


"O FUTURO


Está gostando? Ótimo. Mas, como você pode falar do futuro, de oferecer a sua família um futuro seguro, quando sabe muito bem que o futuro é ilusório? Sabia que esta é a armadilha inventada pelo sistema para assustar as pessoas e forçá-las a se curvar à autoridade, a trabalhar como escravos por medo do maldito futuro? O que é o seu futuro seguro, na verdade? Você se tornou clarividente? No seu trabalho eles prometeram que não haveria mais acidente, cirrose, câncer ou assaltantes que atiram em você de repente? Concordo, falhei na doutrina, mas você não pode pensar por si mesmo? Vamos ver se você, agora, vai me falar de esperança, da necessidade de se ter fé, irmão, porque a salvação está a caminho dessa droga toda.

O SISTEMA

Meu objetivo não é mudar o sistema. Perdemos essa guerra há muito tempo atrás. Olhem para os que nos venceram, os donos do mundo. Estão solidamente estabelecidos. Permitem até que a esquerda exista. Por quê? Porque ela não incomoda ninguém, não há mais a ameaça da revolução. Ela é só um button, um broche ou uma pichação. É apenas saudade. No máximo, é uma atitude moral que jamais ultrapassará o âmbito da vida privada.

O AMOR

- Experiência não quer dizer conhecimento. Não sei nada de mulheres.

- Uma mentira elegante. Há coisas que cavalheiros não gostam de falar.

- As poucas mulheres que conheci em minha vida, admirei, olhei e decidi decifrar. Não consegui. São misteriosas. Nunca deixaram de me surpreender. Hoje o importante é desfrutar de sua presença. Não percebi isso logo, mas depois, aprendi a ouví-las, a valorizar os silêncios...os olhares...Momentos em que parece não acontecer nada, e acontece tudo. Aprendi a respeitar sua intuição, inteligência. E aprendi a amá-las."

Sunday, July 02, 2006

Lugares Comuns

Personagem: Um velho professor em sua última aula, pois soube que foi demitido.


Minha preocupação é que vocês se lembrem de que ensinar é mostrar. Mostrar não significa doutrinar. Significa dar informação, mas também mostrar como compreendê-la e analisá-la, como raciocinar e contestar essa informação. Se algum de vocês for retardado mental e acreditar em verdade revelada, em dogma religioso ou doutrinas políticas, seria mais saudável escolher outra profissão, como pregar de um púlpito ou em praça pública. Se tomarem a infeliz decisão de continuar com isso, tentem deixar suas superstições do lado de fora, antes de entrar na sala de aula. Não obriguem seus alunos a memorizar coisas. Não funciona. Eles rejeitam e rapidamente esquecem o que lhes é imposto. Nenhum jovem será um ser-humano melhor porque sabe em que ano Cervantes nasceu.

Procurem fazê-los pensar, duvidar, se perguntar. Não os julguem pelas respostas, as respostas não são a verdade, a busca delas pela verdade será sempre relativa. As melhores perguntas são as que as pessoas se têm feito desde os tempos dos filósofos gregos. Muitas agora são clichês, mas ainda são válidas: O quê? Como? Quando? Onde? Por quê? Se aceitarmos que a jornada é a meta, a resposta é inválida. Ela descreve a tragédia, mas não a explica. Existe uma tarefa que eu gostaria que vocês executassem. Ninguém lhes designou esta tarefa, mas espero que vocês como professores assumam a responsabilidade de levá-la diante: despertar seus alunos para a dor da lucidez. Sem limites. Sem piedade.

Ah, a lucidez...

A lucidez pode jamais despertar, mas, se despertar, não há como evitá-la. E, quando ela chega, fica para sempre. Quando a gente percebe a falta de sentido na vida, nota que não há objetivos, nem progresso. Compreende, embora possa não querer aceitar, que a vida nasce com a morte ligada a ela, que vida e morte não são consecutivas, mas simultâneas e inseparáveis. Se a gente consegue manter a sanidade e cumprir as normas e rotinas em que não acredita, é porque a lucidez faz a gente ver que a vida é tão banal, que não pode ser vivido como uma tragédia.

Trecho do filme argentino, abre aspas: "Lugares Comuns"